A Formação Corpórea na Etnia Indígena Boe
Alice de Carvalho Lino Lecci
Universidade Federal de Mato Grosso
COMUNICAÇÃO
O rito funeral Boe constitui-se como uma experiência estética, na medida em que a sua realização compreende os cantos, entoados em língua originária (Boe Wadáru), cujas letras aludem à mitologia milenar do Boe Akaru, isto é, às práticas e aos saberes dos seus chefes ancestrais, passados de geração em geração. Esses cantos ainda são acompanhados de instrumentos musicais, como o tambor, maracas, instrumentos de sopro, além das danças, que se equiparam a um evento performático. Na vivência dos ritos, essas práticas artísticas aparecem intrínsecas à vida, sendo que a fruição das mesmas propicia a formação corpórea dessa etnia indígena, ou seja, possibilita o conhecimento acerca da sua identidade mediante determinada afetação sensorial e cognitiva. Dito isso, propõe-se discutir na comunicação a relevância da prática do rito funeral para a educação corpórea desses indígenas no tocante ao Boe Akaru. Trata-se, deste modo, de entender, em alguma medida, como tais práticas artísticas trazem à tona e revitalizam a identidade desse grupo étnico, de modo a propiciar a compreensão que essa sociedade tem de si. Para tanto, lançamos mão dos argumentos de Félix Adugoenau, indígena Boe do clã Baádo Jebáge, metade exogâmica Ecerae, para a caracterização de seu grupo étnico. Ademais, a “identidade” da etnia indígena Boe será discutida também por meio dos aspectos históricos, linguísticos e psicológicos, conforme apresentados por Kabengele Munanga. E por fim, de forma breve, realiza-se um deslocamento de certos argumentos constitutivos do conceito ontológico de trabalho de Herbert Marcuse, referentes ao caráter da permanência e da continuidade, com o propósito de discutir a prática dessas “artes” rituais. Desde já, sustenta-se que essas podem ser compreendidas como uma busca contínua da realização da existência Boe, que gera algo permanente no seio da sociedade, para além da existência particular de seus indivíduos, ou seja, a sua identidade.
Este trabalho foi apresentado no 14º Congresso Internacional de Estética Brasil - Artes do Corpo, Corpos da Arte.