O Candomblé Ketu na conformação da resistência política e da identidade brasileira
Alice de Carvalho Lino Lecci
Universidade Federal de Mato Grosso
O Candomblé Ketu, em especial o Ilê Erô Opará Ofá Odé Asé Jaynã, visitado nesta pesquisa, constitui-se a partir da confluência entre os valores, práticas e saberes relativos à espiritualidade africana e a dos habitantes originários da floresta: os indígenas, os ditos caboclos de pena, além dos boiadeiros, também nascidos em terras brasileiras e cultuados na festa do caboclo. Com isso, não se pretende afirmar que essa religião compreende toda a complexidade existencial desses modos distintos da percepção de si, do outro e da realidade em seu entorno, manifestos em numerosas etnias, africanas indígenas. Contudo, é evidente, em relato da iyálórisá Márcia Cristina de Jesus Moura e do bábálórisá Fábio de Jesus Moura e na literatura referente ao tema, a presença dos Órisás, as divindades africanas da cultura iorubá, e a dos Caboclos, entidades indígenas. Nesse entroncamento cultural erguem-se os ritos relativos ao transe do Candomblé, de modo a adorar os Órisas e Cablocos, como em um rompante, em detrimento da violência dirigida a esses grupos étnicos em meio às relações sociais no Brasil. Na República, a repressão ao Candomblé é institucionalizada mediante o Código Penal de 1890, cujo artigo 157 determina a proibição relativa ao "espiritismo, a magia e seus sortilégios, usar talismãs e cartomancias para espertar sentimentos de ódio ou amor, incultar cura de moléstias curáveis ou incuráveis, enfim, para fascinar e subjugar a credulidade pública". Ademais, o artigo seguinte apresentaria a proibição relativa a "ministrar, ou simplesmente prescrever, como meio curativo para uso interno ou externo, e sob qualquer forma preparada, substância de qualquer dos reinos a natureza, fazendo ou exercendo assim, o ofício do denominado curandeiro".